Há sempre um momento, na carreira do escritor, em que ele se pergunta sobre a necessidade de recorrer aos serviços de um agente literário. As razões desse questionamento, as possíveis respostas e o amplo leque de serviços que uma agência literária oferece compõem as bases deste artigo.
Autores inéditos costumam procurar agentes literários movidos pela certeza de que esses profissionais conseguirão vender suas obras a grandes editoras ou, ao menos, para uma casa editorial que tenha seus títulos expostos em um grande número de livrarias.
Contudo, enquanto o autor alimenta tantas expectativas, o agente literário, agindo de maneira profissional, procura sanar suas próprias dúvidas, que se resumem, num primeiro momento, em saber em qual gênero o autor escreve e quais os assuntos de sua preferência, pois, apesar de existirem poucas agências no Brasil, cada agente – inclusive no exterior – se especializa em algumas áreas do conhecimento. Muitas vezes, portanto, após algum tempo de conversa, o agente percebe que aquele autor seria mais bem atendido por outro profissional.
Uma etapa pode, no entanto, anteceder esse primeiro encontro e facilitar a vida dos dois: o agente literário pode ter procurado esse cliente; ou, o que também é comum, o escritor sentado à sua frente, enchendo-o de perguntas, passou pelo filtro de uma leitura crítica selecionadora; ou, ainda uma terceira possibilidade, o autor foi indicado por amigos e até mesmo por editores.
Mas, de qualquer forma, um primeiro contato sempre será recheado de perguntas que refletem dúvidas simples – por exemplo, sobre observações relacionadas à leitura de um texto recém-terminado – ou até complexas questões contratuais.
Não é o caso dos autores já publicados, independentemente de terem muitos ou poucos títulos, pois esses têm indagações diferentes. Quase sempre, eles se dão conta de que, para administrar suas relações com as editoras, é necessário um conjunto de ações rotineiras, exatamente aquelas que tomam o tempo que eles poderiam dedicar a criar, escrever. Na sua maioria, são autores que, por razões diversas, estão com livros em mais de uma editora e se cansam de organizar uma agenda a fim de acompanhar se o valor “x” refere-se ao direito autoral da obra “y” ou da editora “a”.
Eles sabem que, inclusive, os problemas não param aí. Conforme a obra é reconhecida por professores, críticos literários, livreiros e leitores, enfim, à medida que ela ocupa seu espaço no universo literário, aparecem convites para lançamentos, feiras de livros, palestras, mesas de debates, cursos, adaptações e outros tantos eventos. E quando o autor já se encontra nesse nível de popularidade, ele não considera mais o agente apenas como um vendedor de originais inéditos, mas deseja um administrador de sua carreira. Ou seja, ele sente necessidade de um profissional que, além de manter sua carreira literária em ordem, também o aconselhe nos passos e nas decisões a tomar todos os dias.
E não podemos esquecer dos herdeiros dos autores. Protegidos pela lei, eles recebem, durante setenta anos, os rendimentos das obras. Trata-se de um grupo dividido entre os acostumados à rotina de publicação do mercado editorial e os que nada conhecem dessa realidade. Ambos, ao procurarem um agente, quase sempre desejam não só a administração das obras já publicadas, mas a venda de reedições e o trabalho de manter o autor vivo, comentado e, principalmente, valorizado – em vez de ficarem à sorte de redescobertas ou dos interesses de certos pesquisadores.
Diante desse quadro, a grande pergunta é: mas por que um agente literário para fazer esses serviços? Como veremos a seguir, a resposta não é simples.
Um agente literário é o profissional estruturado para obter, facilmente, informações no mercado editorial e cultural, seja em seu país de origem, seja no exterior. Ele circula amigavelmente entre autores e editores, estando sempre atento às leis de direitos autorais; aos esquemas de distribuição; ao marketing usado na divulgação em diversas mídias; aos interesses dos livreiros (e seus diferentes pontos-de-venda), dos professores, dos produtores de eventos e dos leitores em geral; e às oportunidades de palestras e cursos. Sem esquecer que um bom agente sabe sondar as expectativas dos cineastas, dos diretores de teatro e dos roteiristas, procurando manter-se ligado a todos os profissionais que estão, direta ou indiretamente, relacionados ao texto, não importando se o consideram uma criação artística ou um produto a ser consumido.
Tal somatório de interesses e oportunidades exige uma estrutura mínima, incluindo, por exemplo, consultores jurídicos que possam, rapidamente, assegurar a melhor solução nas questões relacionadas à legislação em vigor. Por causa desse permanente contato com questões legais, é comum as agências darem consultoria a autores e editores, esclarecendo diferentes aspectos contratuais.
Outra necessidade do autor, ainda muito pouco considerada, é sua presença junto ao público – incluindo a imprensa –, algo que já consta na relação de serviços de algumas agências literárias. A imprensa costuma enfatizar apenas o lançamento do produto cultural, voltando ao assunto, no máximo, quando é interessante fazer algum tipo de comentário, relacionando-o a diferentes eventos. Mas isso sempre ocorre de maneira seletiva, o que restringe o número de livros, filmes, peças teatrais e exposições que conseguem críticas ou apenas uma notinha nos cadernos culturais. Dessa forma, contar com um profissional que apresente o universo do autor e de sua obra ao jornalista, disponibilizá-lo como fonte aos veículos/cadernos especializados e orientar a conduta deste mesmo autor diante da imprensa é algo cada vez mais importante. Torna-se fundamental e necessário ter alguém que seja co-responsável por administrar, construir – e até mesmo – reconstruir a imagem de um autor: um assessor de comunicação especializado nessa área.
Outro detalhe imprescindível é manter um rigoroso sistema de arquivos – em papel ou em banco de dados no computador –, especialmente desenvolvido para controlar cada etapa da vida da obra e do autor representados.
Toda essa estrutura é mantida pelo pagamento de porcentagens – segundo os Guides to Literary Agents da Writer’s Digest Books, EUA – entre 10% e 30% do que o autor recebe. Por exemplo, caso o autor tenha $ 1.000 para receber, de $ 100 a $ 300 são repassados ao agente. Essa porcentagem varia de agência para agência. Aquela que representa autores já consagrados ou best-sellers pode cobrar uma porcentagem mais baixa, em virtude do número significativo de exemplares que compõem cada edição da obra, sem considerar os produtos que podem derivar dessas vendas. Mas há outros fatores que alteram essa porcentagem, como a extensão dos serviços contratados pelo autor na agência.
Há também agências que trabalham com a cobrança de uma taxa de entrada ou de leitura crítica – que pode ou não voltar ao bolso do autor após a venda para o mercado. Mas é sempre importante lembrar que todos os agentes têm uma estrutura operacional com custo nunca desprezível, e essa taxa garante o início de seu trabalho, diminuindo um pouco os riscos comuns nessa empresa de representação e prestação de serviços.
E na prática, como funciona?
Acabamos de apresentar um quadro teórico das bases que fundamentam a relação autor-agente. Todavia, tudo isso acontece na prática? Esta é uma boa pergunta para ser respondida por autores e agentes… Se agências prestam serviços a autores, nada melhor do que refletir sobre os serviços prestados:
A venda é o serviço mais solicitado: publicar em livro, adaptá-lo para filme, programa de TV e peça teatral, ou gerar produtos diferenciados. Contudo, a fim de que este serviço se realize, espera-se um autor consciente das características básicas de sua arte. Assim, ele deve ser sincero, falando abertamente com o agente sobre suas fraquezas e seus diferenciais.
Na verdade, alguém só se considera autor quando tem uma obra publicada em qualquer meio; e por essa razão acaba não considerando que a espera pode ser um ponto a favor de sua carreira literária, pois pode preservá-la para parceiros que o respeitem e paguem corretamente seus direitos autorais.
Trata-se de recurso ainda pouco utilizado por autores brasileiros, mas prática comum no mercado cultural do nosso país. Ao desejar esse serviço, o autor pode pensar em um advogado ou um agente, já que ambos estão preparados para conceber contratos que, apoiados na legislação vigente, estabeleçam direitos e deveres iguais às partes envolvidas, conforme as necessidades da obra contratada.
A administração de direitos autorais usa três modelos diferentes no Brasil:
Quando o autor já tem seu nome estabelecido no mercado – isto é, as editoras desejam ou encomendam obras; ele possui adaptações para cinema, televisão e teatro; e a imprensa publica notícias com freqüência sobre sua vida ou sua obra -, ele é procurado para eventos, pois os organizadores destes acreditam que nomes famosos atraem público. Na “agenda” da agência, a administração de qualquer tipo de evento é apenas uma informação a mais a ser considerada. Contudo, a administração dos eventos pode ser independente e opcional em relação aos demais itens do contrato, com negociação de porcentagens específicas para cada caso.
Antes de considerar a adaptação da obra para outro meio de publicação, o autor deve estar consciente de quais as possibilidades de sua obra transitar por outras linguagens. E é sempre bom salientar que, no Brasil, o cinema e o teatro dependem muito de prêmios, incentivos do governo, patrocinadores e permutas, e um grande número de adaptações é feito apenas graças ao esforço, quase sempre sem pagamento, de produtores ou diretores.
O licenciamento aparece na literatura quando o autor ou sua personagem transforma-se em uma marca capaz de chamar a atenção do mercado. Hoje, esse tipo de atividade está voltado basicamente para o público infantil e juvenil. De uma forma ou de outra, o autor deve preocupar-se em associar sua pessoa ou personagem a produções de qualidade.
Um ou mais agentes?
Se uma obra, ao ser editada, demonstra fôlego suficiente para ser traduzida para diferentes países, um novo problema se apresenta ao autor: se ele já contratou um agente no Brasil, por que não outro no exterior?
No caso específico de um autor cuja obra é reconhecida – e já tem um agente em seu país de origem -, ele pode descobrir que precisa de um agente exclusivo para cada uma das atividades e diferentes usos de sua obra. Depois, será natural necessitar de um agente no exterior, pois nem sempre o autor tem fluência em vários idiomas ou tem como verificar se as ofertas que recebe do estrangeiro são realmente interessantes. Hoje em dia, nota-se um movimento de parcerias entre agentes do mundo todo, a fim de reduzir a agenda e alcançar maior penetração regional.
A relação ideal
Diante do exposto, seja qual for o caminho escolhido, o importante é que a relação entre o autor e o agente seja transparente, leal e produtiva; que se estabeleça um fluxo de informações capaz de multiplicar a valorização da obra. O autor deve refletir a fim de que suas decisões possam, inclusive, influenciar no crescimento econômico da agência contratada.
Escrever sobre a contratação de um agente literário no Brasil, onde as relações profissionais da área cultural dependem de questões pessoais e de idiossincrasias, e onde os grupos e os modismos são mais respeitados do que os gêneros e os estilos da escrita, é um risco que resolvemos correr com um único objetivo: mostrar que a cidadania autoral vai além da produção escrita, que, muitas vezes, exigiu anos de trabalho árduo e pesquisa.
Ou seja, o autor não deve se esquecer jamais de que o agente literário age sobre algo: obras, informações, idéias, contratos etc. Mas o único, o exclusivo fornecedor desse algo será sempre o autor.
(…) — Não posso acreditar nisso! — disse Alice
— Não pode? — disse a Rainha com tom de voz penalizado. — Tente outra vez: respire profundamente e feche os olhos.
Alice riu. — Não adianta fazer isso – disse ela – ninguém pode acreditar em coisas impossíveis.
— Eu diria que você nunca praticou bastante. — disse a Rainha. — Quanto eu tinha a sua idade praticava sempre meia hora por dia. Às vezes me acontecia acreditar em seis coisas impossíveis antes do café da manhã. (…)
Através do Espelho e o que Alice encontrou lá de Lewis Carrol. Tradução de Sebastião Uchoa Leite.
(…) ‘I can’t believe THAT!’ said Alice.
‘Can’t you?’ the Queen said in a pitying tone. ‘Try again: draw a long breath, and shut your eyes.’
Alice laughed. ‘There’s no use trying,’ she said: ‘one CAN’T believe impossible things.’
‘I daresay you haven’t had much practice,’ said the Queen. ‘When I was your age, I always did it for half-an-hour a day. Why, sometimes I’ve believed as many as six impossible things before breakfast.” (…)
Through the looking-Glass by Lewis Carrol. Produced by David Widger
(…) — Não posso acreditar nisso! — disse Alice
— Não pode? — disse a Rainha com tom de voz penalizado. — Tente outra vez: respire profundamente e feche os olhos.
Alice riu. — Não adianta fazer isso – disse ela – ninguém pode acreditar em coisas impossíveis.
— Eu diria que você nunca praticou bastante. — disse a Rainha. — Quanto eu tinha a sua idade praticava sempre meia hora por dia. Às vezes me acontecia acreditar em seis coisas impossíveis antes do café da manhã. (…)
Através do Espelho e o que Alice encontrou lá de Lewis Carrol. Tradução de Sebastião Uchoa Leite.
(…) ‘I can’t believe THAT!’ said Alice.
‘Can’t you?’ the Queen said in a pitying tone. ‘Try again: draw a long breath, and shut your eyes.’
Alice laughed. ‘There’s no use trying,’ she said: ‘one CAN’T believe impossible things.’
‘I daresay you haven’t had much practice,’ said the Queen. ‘When I was your age, I always did it for half-an-hour a day. Why, sometimes I’ve believed as many as six impossible things before breakfast.” (…)
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